Um ato interreligioso realizado na tarde desta quarta-feira (14) deu início às escavações no estacionamento da Pupileira, no bairro de Nazaré, em Salvador, área que pode abrigar o maior cemitério de escravizados da América Latina. A data marca os 190 anos da execução dos líderes da Revolta dos Malês, um dos principais levantes de escravizados da história do Brasil.
Lideranças de diferentes religiões — entre elas, representantes de religiões de matriz africana, católica, evangélica e muçulmana, participaram da cerimônia, que teve como objetivo homenagear e respeitar a memória das milhares de pessoas possivelmente sepultadas no local, muitas delas sem qualquer rito fúnebre.
Segundo as investigações coordenadas pela arquiteta e pesquisadora Silvana Olivieri, o terreno pode conter restos mortais de até 100 mil pessoas, incluindo escravizados, indigentes, prostitutas, suicidas, excomungados e condenados à morte, além de líderes da Revolta dos Malês e possivelmente também da Revolta dos Búzios.
“Hoje é 14 de maio, um dia simbólico para iniciarmos um processo de resgate histórico. Se confirmada a existência do cemitério, estaremos diante de um dos maiores achados arqueológicos relacionados à escravidão nas Américas”, afirmou a promotora de Justiça Lívia Vaz, presente no ato. “Esse espaço representa o direito à memória e à verdade, e o apagamento desse passado é parte da violência histórica que ainda precisa ser reparada”, completou.
O cemitério, segundo a pesquisa, foi criado no século 18, inicialmente sob responsabilidade da Câmara Municipal de Salvador, e posteriormente gerido pela Santa Casa de Misericórdia da Bahia. Após funcionar por cerca de 150 anos, foi oficialmente fechado em 1844 e, com o tempo, apagado da paisagem urbana, sendo transformado em outras estruturas, como o atual estacionamento da Pupileira.